EXPOSIÇÃO "ÁFRICA: OLHARES CURIOSOS", Hilton Silva

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Protestos contra o racismo no Marajó



Foram três dias intensos de muito debate e palestras. O tema central das discussões foi o racismo, nas suas mais variadas formas. Não faltaram relatos de experiências com tom de revolta ou com alto grau de emoção sendo, por ora, provocado o choro e muitas palavras de ordem incendiando o cenário das discussões.


A capoeira foi debatida quando o tema era a corporeidade do negro, resgatando toda uma história de luta e resistência dos negros pela liberdade e as religiões afrodescendentes foram o foco da discussão quando se falou de liberdade religiosa. Rodrigo Santos, um dos introdutores deste debate no município de Salvaterra, foi enfático em afirmar que a resistência ainda é grande em se conhecer e respeitar o credo religioso dos outros. “Estamos sendo educados a sermos intolerantes. Isso é muito ruim. Precisamos respeitar, mas para isso é preciso conhecer. Nunca obrigados a aderir, mas conhecer para respeitar” repetiu por diversas vezes o professor que já foi perseguido e exonerado da função numa escola pública em Salvaterra, por ter aberto este debate com seus alunos, junto com sua colega, professora Carmem. “Eles tanto fizeram para impedir, que olha só no que deu. Agora não é mais somente o Vasconcelos em Salvaterra, a coragem daqueles estudantes que foram as ruas se estendeu também para Soure, que está dando um grito contra este racismo burro” concluiu Rodrigo.

Joana Carmem e Tony Vilhena vieram de Belém especialmente para prestigiar o evento com suas palestras. Um falou do movimento de homens e mulheres contra o racismo e o outro tratou do regime de cotas nas universidades. O tipão de Joana chamou a atenção, mais pela sua espontaneidade e irreverência que somou-se ao estilo extravagante, valorizando suas características negras. Joana levantou as plateias em Salvaterra e Soure, sendo enfática ao afirmar que o Brasil é um pais negro “E temos que nos assumir de uma vez por todas, homens e mulheres. Basta de nos escondermos atrás de um discurso que mascara a nossa situação para fortalecer a minoria dominante que reina a séculos no Brasil”.

A semana teve debates ardorosos onde estudantes divergiram de palestrantes e relataram casos gritantes de violência contra o direito dos negros. Num dos casos mais intrigantes, um aluno de Salvaterra relatou não ter conseguido o emprego em Belém por que exigiram que ele mudasse de religião. Muitos estudantes relembraram os episódios vergonhosos ocorridos há alguns anos quando os professores da escola Oscarina Santos foram demitidos e rechaçados pelos colegas de trabalho por terem aberto o debate sobre a Lei do Estado Laico e o ensino religioso nas escolas. “Eu fui pras ruas protestar contra aquela vergonha promovida na minha escola pela direção, pela Secretária de Educação e pelo Prefeito da cidade. Eles queriam que todos fossemos evangélicos ou católicos, mas não pode ser assim” disse uma das alunas, demonstrando inquietude.



Até uma peça teatral foi montada pelos alunos da zona rural, em Salvaterra, e o sucesso foi tão grande que foi levada para Soure. “Ficamos surpresos com o resultado do trabalho deles. Uma iniciativa que partiu da própria turma. Foi inteiramente construída por eles e apresentada com este tom de profissionalismo e seriedade” disse o professor Vinicius Darlan, coordenador do projeto.
A semana foi encerradas com duas grandes passeatas pelo centro de Soure, pela manhã e pelo centro de Salvaterra a tarde. Antes de saírem as ruas eles escolheram o mais belo negro e a mais bela negra em cada cidade. Em Soure os eleitos foram Evie e Werikson e em Salvaterra Jéssica e Bruce. Alunos dos dois municípios atravessaram o rio e foram integrar as passeatas que teve a presença da banda de fanfarra da escola Gasparino Batista, nas duas cidades. Os manifestantes utilizaram apitos e pintaram os rostos com as cores da África. Dezenas de bandeiras e faixas foram utilizadas em homenagem aos africanos e as referências culturais como a capoeira, o carimbo e a culinária brasileira. Fogos e muitas palavras de ordem deram o tom do protesto que abalou o centro comercial de Salvaterra e Soure. As pessoas saiam nas janelas e portas para ver a passeata passar. O dia terminou com os estudantes em dispersão na Praça Magalhães Barata, em Salvaterra.

Fonte: Blog do Dário Pedrosa

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